Resumo
Este artigo sistematiza e atualiza as principais reflexões de minha tese de doutorado sobre processos de produção musical no contexto dos estúdios de gravação. Partindo da configuração institucional do campo fonográfico brasileiro, tendo em vista matrizes de referência anglo-americanas, analiso os ambientes mencionados, as categorias profissionais que neles atuam e os equipamentos em circulação como elementos de um ritual objetivador deste mundo sonoro. Utilizo como recursos metodológicos fontes bibliográficas, documentais, entrevistas com interlocutores ligados ao meio, bem como experiência etnográfica multisituada, conduzida especialmente entre 2017 e 2018, junto às camadas médias das cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, sudeste brasileiro. Ao problematizar os tópicos citados dentro do marco teórico dos sound studies, em diálogo com uma antropologia dos objetos e do ritual, apresento ainda uma cena de minha vivência no estúdio Space Blues argumentando que o fenômeno em relevo se espraia e materializa em redes que se entrecruzam, ganhando contornos locais específicos. Espera-se que o enfoque apresentado possa trazer subsídios para o campo da cultura material, os estudos sobre as relações de trabalho, a etnomusicologia, entre outros.
Referências
AMARAL, Inês. Participação em rede: do utilizador ao “consumidor 2.0” e ao “prosumer”. Comunicação e Sociedade, v. 22, p. 131-147, 2012. Disponível em: https://revistacomsoc.pt/index.php/revistacomsoc/article/view/1261/1243. Acesso em: 10 jun. 2025. DOI: http://dx.doi.org/10.17231/comsoc.22(2012).1278
BARTZ, Guilherme; OLIVEN, Ruben. Como o trabalho flexível afeta os músicos eruditos? O caso da orquestra de câmara Theatro São Pedro de Porto Alegre. Sociologia & Antropologia, v. 9, n. 1, p. 135-158, 2019. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sant/a/YKdkW3XjSsYGVWV5fPjwxTm. Acesso em: 10 jun. 2025. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/2238-38752019v916
BATES, Eliot. What Studios Do? Journal on the Art of Recording Production, n. 7, November, p. 1-27, 2012.
BECKER, Howard. Integrated professionals, mavericks, folk artists, and naive artists. In: BECKER, Howard. Art Worlds. California: University of California Press, 1982.
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de suas técnicas de reprodução [trad. José Lino Grünnewald. In: GRÜNNEWALD, José Lino (org.). A ideia do cinema. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1969.
BENNETT, Andy; DAWE, Kevin. (Eds.). Guitar Cultures. New York, London: Routledge, 2001.
BITTER, Daniel. A bandeira e a máscara: estudo sobre a circulação de objetos rituais nas folias de reis. 2008. 203p. Tese (Doutorado em Antropologia Social), Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2008.
CAMPELO, Isabel. “That Extra Thing” – the Role of Session Musicians in the Recording Industry. Journal on the Art of Recording Production, n. 10, July, p. 1-9, 2015.
CARVALHO, José Jorge de. Transformações da sensibilidade musical contemporânea. Horizontes Antropológicos, v. 5, n. 11, p. 53-91, 1999.
CASTRO, Guilherme de. A performance do som: produção e prática musical da canção em estúdio a partir do conceito de sonoridade. 2015. Tese (Doutorado em Música), Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2015.
CICHOCKI, Piotr. Sound production as a cultural practice: recording studios in the northern region of Malawi. SoundEffects, v. 9, n. 1, p. 61-80, 2020.
DIAS, Márcia Tosta. Indústria fonográfica: reinvenção de um negócio. In: Bolaño, Golin e Brittos (org.). Economia da arte e da cultura. São Paulo: Itaú Cultural, 2010.
GARCÍA, Isaac. Reflexiones en torno a la noción de arte sonoro y los límites y contextos del grafismo musical. Arte, individuo y sociedad, v. 32, n. 1, p. 97-116, 2020.
GELL, Alfred. Technology and Magic. Anthropology Today, v. 4, n. 2, p. 6-9, 1988.
GENNEP, Arnold Van. Os ritos de passagem: estudo sistemático dos ritos da porta e da soleira, da hospitalidade, da adoção, gravidez e parto, nascimento, infância, puberdade, iniciação, coroação, noivado, casamento, funerais, estações, etc. Petrópolis: Vozes, 1977.
GOFFMAN, Erving. Ritual de interação. Ensaios sobre o comportamento face a face. Petrópolis: Vozes, 2011.
HIRSCHKIND, Charles. Cassette sermons, aural modernities and the Islamic revival in Cairo. In: STERNE, Jonathan (Ed.). The sound studies reader. Nova York: Routledge, 2012.
INGOLD, Tim. Materials against materiality. Archaeological dialogues, v. 14, n. 1, p. 1-38, 2007.
KATZ, Mark. Causes. In: KATZ, Mark. Capturing sound: how technology has changed music. Berkeley & Los Angeles: University of California Press, 2004.
KEALY, Edward. [1979]. From craft to art. The case of sound mixers and popular music. In: FRITH, Simon; GOODWIN, Andrew (Eds). On record: rock, pop and the written word. London: Routledge, 1990.
LATOUR, Bruno. Reagregando o social: uma introdução à teoria do ator-rede. Salvador-Bauru: EDUFBA-EDUSC, 2012.
LEFFORD, Nyssim. Recording studios without walls: geographically unrestricted music collaboration. 2000. 147p. Tese (Mestrado em Media, Arts and Sciences), Instituto de Tecnologia de Massachusetts, Cambridge, 2000.
MAUSS, Marcel. As técnicas do corpo. In: MAUSS, Marcel. Sociologia e antropologia [Trad. Paulo Neves]. São Paulo: Cosac Naify, 2003.
MEINTJES, Louise. O sentimento da política: produzindo zuluidade em um estúdio de gravação sul-africano. Revista Debates, v. 8, p. 71-92, 2005.
MEINTJES, Louise. The recording studio as a fetish. In: STERNE, Jonathan (org.). The sound studies reader.. New York: Routledge, 2012.
MORELLI, Rita. Indústria fonográfica: um estudo antropológico [2ªed]. Campinas: Editora Unicamp, 2009.
PEREIRA, Edmundo. Representação fonográfica e curadoria sonora: notas sobre dialogia e desentendimento. In: CURY, Marília (Org.). Direitos indígenas no museu. Novos procedimentos para uma nova política: a gestão de acervos em discussão. São Paulo: Secretaria da Cultura/ACAM Portinari/Museu de Arqueologia e Etnologia, 2016.
PETIT DE MURAT, Facundo; POTENZA, Nahuel Vicente Carlos. Sonoridades subterráneas: una etnografía de los músicos del subterráneo de la ciudad de Buenos Aires. El oído pensante, v. 7, n. 2, p. 64-91, 2019. Disponível em: http://ppct.caicyt.gov.ar/index.php/oidopensante. Acesso em: 3 fev. 2022.
STRATHERN, Marylin. Kinship assisted. In: STRATHERN, Marylin. Reproducing the future: anthropology, kinship, and the new reproductive technologies. New York: Routledge, Chapman & Hall, 1992.
THOMPSON, Paul & LASHUA, Brett. Getting it on record: issues and strategies for ethnographic practice in recording studios. Journal of contemporary ethnography, v. 43, n. 6, p. 746-769, 2014.
TURINO, Thomas. The recording fields. High fidelity and studio audio art. In: TURINO, Thomas. Music as social life: the politics of participation. Chicago: The University of Chicago Press, 2008.
TURNER, Victor. O processo ritual: estrutura e anti-estrutura. Petrópolis: Vozes, 1974.
VICENTE, Eduardo. Música e disco no Brasil: a trajetória da indústria nas décadas de 80 e 90. 2002. 349p. Tese (Doutorado em Comunicações). Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, 2002.
WAINER, Daniel. “Quem manda é a deusa Música”: os bastidores do processo fonográfico em estúdios. 2020. 332p. Tese (Doutorado em Antropologia Social), Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2020.
WAINER, Daniel. Trajetórias da digitalização: músicos e materiais nas redes sociotécnicas da indústria fonográfica brasileira. 2016. 167p. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social), Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2016.
WATSON, Allan. Cultural production in and beyond the recording studio. New York: Routledge, 2015.

Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution 4.0 International License.
Copyright (c) 2025 Daniel Ferreira Wainer
